Trataremos no presente artigo da inclusão na base de cálculo do ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) das tarifas de uso do sistema de transmissão e distribuição de energia, as denominadas de: TUSD e TUST, nas notas fiscais de fornecimento de energia elétrica emitidas pelas concessionárias e cobradas dos consumidores.
A consequência dessa inclusão é a cobrança indevida do ICMS, o qual é cobrado mensalmente dos consumidores, pessoas físicas ou jurídicas, nas faturas de energia elétrica emitidas pelas concessionarias, uma vez que o consumidor é o contribuinte de fato deste imposto.
A TUSD (Tarifa de Utilização de Serviços de Distribuição) e a TUST (Tarifa de Utilização de Serviços de Transmissão), estão demonstradas nas faturas de consumo no quadro que demonstra o fornecimento mensal, e, o que vem sendo indevidamente cobrado a maior é o ICMS sobre a DISTRIBUIÇÃO, a TRANSMISSÃO e os ENCARGOS.
Neste trabalho analisaremos faturas emitidas contra consumidores, pessoa física e jurídica, e demostraremos que a cobrança do ICMS é feita sobre uma base de cálculo superior àquela legalmente prevista, sendo que, tal tributo, não está incidindo somente sobre o valor da energia elétrica efetivamente consumida, mas também sobre as tarifas de uso do sistema de transmissão e distribuição de energia. A TUST e a TUSD não constitui venda de energia elétrica, logo, não são fato gerador do ICMS.
Nos termos do artigo 155 § 2º, alínea “b” da Constituição Federal, a energia elétrica, para fins tributários, é considerada mercadoria. E, conforme o exposto infra constitucionalmente, na Lei Kandir, artigo 2º, que define as hipóteses de incidência do ICMS, somente as operações relativas à circulação de mercadoria “in verbis”:
Art. 2º O imposto incide sobre:
I – operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares;
Neste sentido o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem decidido pela não inclusão destes valores referentes na base de cálculo do ICMS. Conforme os precedentes, o ICMS somente incide nas operações que envolvem a comercialização (consumo) de energia elétrica para o consumidor final, sendo que a TUST e a TUSD não fazem parte desta situação.
PROCESSO CIVIL – TRIBUTÁRIO – AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL – COBRANÇA DE ICMS COM INCLUSÃO EM SUA BASE DE CÁLCULO DA TARIFA DE USO DO SISTEMA DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA – TUSD – INCLUSÃO NA BASE DE CÁLCULO DO ICMS – IMPOSSIBILIDADE – PRECEDENTES. 1. É firme a Jurisprudência desta Corte de Justiça no sentido de que não incide ICMS sobre as tarifas de uso do sistema de distribuição de energia elétrica, já que o fato gerador do imposto é a saída da mercadoria, ou seja, no momento em que a energia elétrica é efetivamente consumida pelo contribuinte, circunstância não consolidada na fase de distribuição e transmissão. Incidência da Súmula 166 do STJ. Precedentes jurisprudenciais. 2. Agravo regimental não provido. (STJ – AgRg no REsp: 1075223 MG 2008/0161184-5, Relator: Ministra ELIANA CALMON, Data de Julgamento: 04/06/2013, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/06/2013).
O STJ, no âmbito dos recursos repetitivos editou a súmula nº 391 que consolida a tese que para acontecer a incidência do ICMS deverá sempre ocorrer consumo de energia elétrica.
Súmula 391 do STJ: O ICMS incide sobre o valor da tarifa de energia elétrica correspondente à demanda de potência efetivamente utilizada.
A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), através da Resolução nº 414/2010 esclarece em seu artigo 14, para fins de responsabilidade, o momento em que ocorre a transferência da energia elétrica (mercadoria) para o consumidor, qual seja:
Art. 14. O ponto de entrega é a conexão do sistema elétrico da distribuidora com a unidade consumidora e situa-se no limite da via pública com a propriedade onde esteja localizada a unidade consumidora (…)
O ponto de entrega da energia elétrica é o relógio medidor, momento em que a energia ingressa no estabelecimento e momento que será efetivamente consumida, configurando assim, a circulação da mercadoria e dando ensejo a cobrança do imposto.
Desta forma, o cálculo e a cobrança do ICMS sobre as tarifas de transmissão e distribuição da energia elétrica, denotam claramente que o tributo incide sobre um fato gerador não previsto na legislação, o que viola frontalmente o princípio constitucional da legalidade previsto no artigo 150, inciso I, da nossa Carta Magna, o qual, veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, exigir ou aumentar tributo sem previsão legal.
Diante do exposto, não resta dúvida do direito do consumidor, seja ele pessoa física ou jurídica, requerer a repetição do indébito tributário e outras cobranças indevidas ocorridas nos últimos 5 (cinco) anos, com as devidas atualizações monetárias, bem como, a exigir a descontinuação da incidência do ICMS sobre tais tarifas.
O Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) foi regulamentado pela Lei Complementar nº 87/96 e tem alíquotas diferenciadas para cada Unidade da Federação. O art. 155, § 2º, inc. III, da Constituição Federal de 1988 (CF/88), dispõe sobre a seletividade para este tributo e estabelece que o imposto estadual poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços. “Seletivo” decorre de seleção, referindo-se à escolha de acordo com critérios e objetivos fundamentados. “Essencialidade”, por sua vez, diz respeito à qualidade do que é indispensável, necessário, importante. Entretanto, este assunto será abordado com maiores detalhes numa próxima oportunidade.
Para auxiliar no entendimento analisaremos faturas emitidas, pela AES ELETROPAULO, para pessoa física e jurídica e destacaremos os itens correspondentes às tarifas cobradas no mês e o cálculo do valor do ICMS a merece o pedido de restituição. Vejamos como chegar ao valor a ser devolvido.
Utilizamos, neste primeiro exemplo, o faturamento foi realizado para uma Pessoa Física, com emissão em Abril de 2017, pela Eletropaulo Metropolitana Eletricidade de São Paulo S.A. No caso, por tratar-se de um contribuinte pessoa física e observando o principio constitucional da seletividade a alíquota no Estado de São Paulo, é de 25%:
- Distribuição = R$ 61,72
ICMS distribuição = R$ 61,72 x 25% = R$ 15,43
- Transmissão = R$ 11,55
ICMS transmissão = R$ 11,55 x 25% = R$ 2,89
- Encargos = R$ 41,06
ICMS encargos = R$ 41,06 x 25% = R$ 10,27
- Total das tarifas no período = 114,32
Total do ICMS cobrado R$ 15,43 + R$ 2,89 + R$ 10,27 = R$ 28,59
Para os contribuintes Pessoa jurídica é observado o mesmo critério de incidência e, outra vez, observado o principio da seletividade com a alíquota de 18%, como segue.
- Distribuição = R$ 371,66
ICMS distribuição = R$ 371,68 x 18% = R$ 66,90
- Transmissão = R$ 66,90
ICMS transmissão = R$ 69,52 x 18% = R$ 12,51
- Encargos = R$ 418,76
ICMS encargos = R$ 418,76 x 18% = R$ 75,38
- Total das tarifas no período = 859,96
Total do ICMS cobrado R$ 66,90 + R$ 12,51 + R$ 75,38 = R$ 154,79
Estes cálculos foram elaborados para demonstrar o real valor do ICMS pago a maior nas faturas do mês de abril/2017(Pessoa Física) e março/2017(Pessoa Jurídica). Vale destacar que, para chegarmos ao valor a ser pleiteado na Ação Judicial, o mesmo trabalho deverá ser realizado em todas as faturas dos últimos 5 (cinco) anos, prazo possível para o pedido de restituição, ou seja, serão 60 faturas, por contribuinte, a serem analisadas e demonstradas individualmente.
O montante do pagamento a maior encontrado será atualizado monetariamente pelo INPC ou outro índice equivalente e restituído ao contribuinte em liquidação de sentença.
Importante destacar que, o valor a ser devolvido sempre dependerá dos cálculos realizados e o contribuinte que pagar mais, consequentemente terá mais restituição. Assim ressaltamos, também, a importância de uma analise e demonstração precisa de todas as faturas do período. Outro ponto é que, na AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DO ICMS, deverá também ser pedido o fim desta cobrança ilegal do tributo e o único caminho é a via judicial.
Cícero Moreira Mesquita
OAB/SP nº386.617
–Advogado – formado pela Universidade de São Caetano do Sul/SP (USCS). Sócio do Escritório Mesquita & Kondo Advogados.
– Contador – formado pelo Instituto de Ensino Superior de Santo André (IESA).
– Pós-graduado em Controladoria pela Fundação Alvares Penteado São Paulo-SP (FECAP) e extensão em Controladoria e Finanças pela Fundação Getúlio Vargas – São Paulo/SP (FGV).
– Experiência profissional – mais de 20 (vinte) anos assessorando e atuando em empresas de pequeno, médio e grande porte nas áreas, Tributária, Contábil, Financeira e Controladoria.